"O poeta morreu. Postumamente, se publicam os seus versos. (...) Maníaco sagrado, o poeta está próximo do xamã, do profeta e do louco, mas sem doutrina em que tenha de crer, nem divindades por que se deva deixar possuir, nem delírio a que esteja coercivamente submetido. Proclamador do patente que os outros ocultam ou evitam, ser poeta não é meio, mas princípio e fim."

domingo, 22 de novembro de 2020

Tudo renasce em todo o lado


Tudo renasce em todo o lado

risos, murmúrios e saudades

o rebento de flor que me foi dado

ecoam da terra antigas liberdades

Pã reencontra-se em cores e sons

ouvem-se flautas, gemem violinos

todos estamos belos, todos somos bons

casamento e batizado este repicar de sinos

o verde enche os olhos e aspira-se do chão

tudo volta a estar calmo, ouve-se na brisa a paz

nada adoenta agora, nada em todo o mundo é vão

tudo são esperanças que de novo o vento traz

 

Aspiro sôfrego o pólen libertado

estendo os meus olhos em direção a todo lado

deixo entrar nos ouvidos palavras e trinados

deito-me na relva entranhando a frescura

saboreio delícias secretas em gelados

enquanto este inebriamento dura

 

Se tanta fome deu em tal fartura

valeu a pena sofrer tão grande espera

 

Fica para trás a era da amargura

reina enfim absoluta a primavera


Joaquim Lúcio, O Jazigo do Poeta, Vol. II, abertura, p. 55. 

Sem comentários:

Enviar um comentário

No tempo em que ainda escrevíamos poemas

No tempo em que ainda escrevíamos poemas (ontem só e, porém, um abismo intransponível entre o que houve e o que ficou), no tempo em qu...