Duas noções de tempo colidem no Jazigo com uma terceira. A temporalidade da projeção existencial que, quer se queira, quer não, é dominada pela cisão da subjetividade, e a necessidade de supor uma dimensão mais funda, o pressuposto de um originário indizível e irrepresentável a que simbolicamente Lúcio chama terra. Porém, o domínio da terra é o do decreto intemporal ou só determinado pelo tempo eterno da presença. Não se pode dizer que este tempo seja transcendente porque é a pura possibilidade imanente do presentar-se dos entes. Na verdade, é o sempre aqui imediato nunca manifestado em qualquer presente. Cada coisa presente é possibilitada pela presença que lhe subjaz, mas esta permanece inobjetivável e irrepresentável sempre já aqui e sempre igual. Porém, a petrificação da subjetividade toma consciência inobjetivável dela, sendo totalmente incapaz de a tornar sua e totalmente incapaz de não ser submergido por essa consciência antepredicativa. Mas tal petrificação só ocorre pelo cancelamento das possibilidades no projeto da existência, no tempo existencial. Ambas as noções se contrapõem ao tempo-duração, o tempo dos horários, dos calendários e dos relógios que não passa de uma medida da duração e nem corresponde à realidade, o tempo metafísico da presença, nem à vivência, o tempo existencial do projeto. Quando, porém, a impossibilidade de alcançar o tempo metafísico e a incapacidade de realizar o tempo existencial se evidenciam, impõe-se o tempo vazio da duração, o tempo das obrigações profissionais, o tempo das absurdas formalidades sociais, o tempo do destituído envelhecimento em que já só se dura. E tal duração não decorre apenas, é sofrida, é estilhaçante da continuidade, é fragmentadora da consciência, constantemente contrastada com a consciência de poder ser mais, inteiro e autêntico como cada qual se chegou a sonhar. O inferno são os outros? De certa forma, visto nos tornarmos outros, estranhos, estrangeiros em relação à nossa própria projeção.
Blog criado criado para substituir uma página de Facebook de promoção de um livro em quatro volumes publicado na Bubok em novembro de 2019. Entretanto, o livro migrou para a Chiado em 2021 e para a Amazon em 2022, onde foi publicado igualmente um novo livro.
"O poeta morreu. Postumamente, se publicam os seus versos. (...) Maníaco sagrado, o poeta está próximo do xamã, do profeta e do louco, mas sem doutrina em que tenha de crer, nem divindades por que se deva deixar possuir, nem delírio a que esteja coercivamente submetido. Proclamador do patente que os outros ocultam ou evitam, ser poeta não é meio, mas princípio e fim."
domingo, 22 de novembro de 2020
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